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Em entrevista para o Grupo Liberal, Hildemir Freitas explicou sobre sua trajetória no mercado comercial de Belém e a loja de antiguidades em Belém. Ele explicou que a capital paraense é uma referência no mercado de antiguidades pelo período em que a capital paraense foi um centro cultural durante a Belle Époque e que os preços podem variar de R$10,00 a R$10.000,00.

Repórter: Esther Pinheiro
Imagens: Cristino Martins
Edição: Bia Rodrigues (supervisão: Tarso Sarraf)

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Transcrição
00:00Eu não morava em Belém, eu vim passar umas férias aqui e vi que em Belém não tinha loja de presentes.
00:06Ou melhor, não tinha não, tinha duas.
00:08Uma que existe até hoje, que vende flores, vendia flores e bronze, e existe até hoje.
00:14E uma que já tinha sido uma grande loja de presentes e que tinha diminuído muito, não sei porquê.
00:21Estava na Manuel Barata, numa portinha pendurada, onde tinha coisas boas, cristal tcheco.
00:27Mas tinha também bacia, bicicleta, pinico, tudo misturado.
00:34Então eu resolvi montar uma loja de artigos de presentes em Belém.
00:38Aí voltei para cá, eu era gerente de uma agência de propaganda, e eu fiz demissão.
00:45E voltei para Belém para montar uma loja de presentes que eu queria montar.
00:50E montei uma loja de presentes modernos, com coisas que não existiam aqui.
00:54E era lançamento no Brasil inteiro de pinho, acrílico, era novidade.
01:01Isso foi em 76, pouco tempo atrás.
01:05E eu montei e me dei muito bem.
01:09E daí foi evoluindo, crescendo, crescendo, crescendo a loja,
01:14quando veio a notícia de que abriu um shopping em Belém.
01:20Não existia shopping em Belém.
01:21E uma arquiteta da equipe que montou o shopping, se não me engano era Ibirapuera,
01:32e era uma arquiteta paraense, né, que foi contratada para fazer parte da equipe,
01:39veio e me disse, olha, tem que botar uma loja tua no shopping,
01:42porque a tua loja é muito boa, muito conhecida, e realmente era,
01:45a loja ficava cheia, lotada mesmo.
01:49E eu pensei, eu já estava juntando dinheiro para fazer a reforma,
01:54porque a loja funcionava aqui, nesse mesmo local,
01:57só que não era como está hoje, né.
02:00Era uma casa antiga, velha, de telhado,
02:04com goteira, com todos os problemas de casa velha.
02:07Então, eu já estava juntando dinheiro para reformar a casa,
02:16perguntei, quanto é, quanto custa isso?
02:19Então, para eu comprar, seria 300 mil cruzeiros.
02:25Eu já estava com dinheiro guardado, já de economia,
02:28daria para comprar.
02:31Mas eu pensei o seguinte, loja de shopping,
02:34por mais que você compre, não é sua.
02:37Por quê?
02:39Porque você tem que seguir as regras do shopping,
02:42que é muito difícil.
02:45Você arca com uma despesa mensal fixa,
02:48e às vezes mais do que o fixo, né.
02:51Todas as promoções do shopping,
02:53você é obrigado a participar das promoções,
02:55e outras coisas mais que dificultam a vida do comerciante.
02:59E o que eu tinha arrecadado, guardado de dinheiro,
03:02eu consegui fazer a reforma devagarinho,
03:04e reformei esse espaço aqui.
03:06Então, eu comecei com o artigo de presente.
03:08Quando ia fazer compras, eu passava um mês viajando,
03:12em várias cidades, em vários lugares.
03:15Eu viajei o Brasil quase todo,
03:16procurando mercadoria, coisa diferente,
03:19para vender aqui na loja.
03:21Daí o sucesso que foi no início.
03:23Até o nome da loja, que é Coisa Paca,
03:26Coisa Paca era uma gíria dos anos 70.
03:29E a loja abriu em 76.
03:31Então, quando você dizia, que tal?
03:32Tem muita coisa ali.
03:33E aí, tem Coisa Paca.
03:35Era sinônimo de bastante coisa.
03:39Então, quando abriu, quando se iniciou o shopping,
03:44muitas lojas de presente abriram no shopping.
03:47E fora do shopping.
03:48Por exemplo, nesse quarteirão aqui,
03:50que tem várias lojinhas, né,
03:51tinham oito lojas de presentes.
03:53Oito.
03:55Não tem nenhuma mais, só a minha.
03:58Como eu vi que as feiras de presentes,
04:01todo mundo ia para as feiras,
04:03todo mundo comprava as mesmas coisas,
04:05então, o mesmo artigo que tinha aqui,
04:07que tinha nas outras lojas.
04:09Aí eu fui saindo da linha de presentes
04:11e entrando na linha de antiguidade,
04:13uma coisa que eu sempre gostei,
04:14meu pai gostava muito de antiguidade.
04:17A gente, eu já, desde criança,
04:19comecei a ver a antiguidade e tudo,
04:21a gente se familiariza com isso.
04:24E eu fui mudando, mudando, mudando,
04:26mesclando, mesclando,
04:27até que eu saí da linha de presentes
04:29e fiquei só na linha de antiguidade.
04:31Então, o meu início foi assim.
04:33Como foi que eu montei?
04:34Várias pessoas que tinham coisas antigas,
04:36às vezes, herdavam de outras pessoas
04:38e não queriam, os filhos não queriam.
04:40Isso acontece muito hoje em dia também.
04:42Sempre aconteceu.
04:44Aí vim aqui me vender as peças,
04:47ou então deixar em consignação.
04:49Hoje eu pego peças em consignação
04:51para colocar aqui na loja.
04:53Aí qual é o meu sistema?
04:54Eu marco junto com o cliente o preço.
04:56O preço que o cliente diz,
04:58a gente etiqueta a peça.
05:00Todas as minhas peças aqui são etiquetadas.
05:03Nenhum preço é dado de cabeça.
05:04Entendeu?
05:06E eu ganho um percentual na venda.
05:09A gente avalia, assim,
05:10o estado de conservação em primeiro lugar.
05:13Depois, se é uma peça antiga,
05:14se ela está restaurada, bem restaurada,
05:18mal restaurada,
05:19porque existe também isso, né?
05:21Então, a avaliação vai do estado da peça.
05:24Olha, o público é variável.
05:27Vem jovem, vem idoso.
05:30As pessoas idosas são os que vêm mais aqui, né?
05:34Mas, ultimamente, muitos jovens têm vindo.
05:36Inclusive, vêm, assim,
05:39jovens informados.
05:42Eu falo informados, assim.
05:44Nasceram em ambientes onde tinham antiguidade,
05:47viram peças antigas desde criança.
05:50E isso aí
05:51cria uma familiaridade com a peça.
05:54Entendeu?
05:55E tem jovem que vem aqui que nunca viu.
05:59Aí,
05:59mexe muito com a cabeça das pessoas.
06:02Por exemplo, tem gente que
06:02ah, eu não suporto isso.
06:04Isso é coisa de velho.
06:06Não, isso tem espírito.
06:08Tem gente que pensa assim, né?
06:10Não, Deus o livre, tem energia negativa.
06:12Ele não tem nada disso.
06:13Não existe isso.
06:14E vem famílias.
06:17Vem decoradores,
06:19arquitetos, né?
06:21Eu conheço muitos arquitetos aqui.
06:23Às vezes me telefonam,
06:24tem tal peça assim,
06:25eu preciso de um vaso tal tamanho assim,
06:27tal cor,
06:28se tem aí.
06:29Vem de modo geral.
06:31E vem turista também.
06:33Depende muito do...
06:35do trabalho que eles têm, né?
06:39Por exemplo,
06:39tem arquitetos que são informados,
06:41que são,
06:42não vou nem até dizer mais velhos,
06:44não, não, jovens,
06:45mas que são informados,
06:46que sabem o que é uma peça antiga
06:48numa decoração
06:49e valoriza a decoração.
06:51Hoje eu sei.
06:53Quer dizer, na época eu não sabia,
06:54mas hoje eu sei.
06:56O Norte foi, assim,
06:58capital da cultura do Brasil.
07:01Sabia disso?
07:03As óperas vinham da Europa pra cá,
07:07se apresentavam aqui no Teatro da Paz,
07:09que foi fundado no fim do século XIX.
07:12No início do século XX,
07:14o Grande Hotel,
07:16que já também não existe, né?
07:18Que era maravilhoso,
07:19era um prédio espetacular.
07:22Os artistas se hospedavam no Grande Hotel,
07:24era só atravessar a rua,
07:25estavam no Teatro da Paz.
07:27Entendeu?
07:28Por quê?
07:29Na época,
07:31a borracha
07:32movimentava muito dinheiro aqui.
07:35Entendeu?
07:35Então, a elite paraense,
07:36o pessoal se reunia em grupos
07:38para assistir ópera na Europa.
07:43Entendeu?
07:44Eu li, já em algum lugar,
07:46não me lembro onde,
07:47que famílias daqui
07:48mandavam lavar roupas
07:50em Portugal.
07:52Você pensou,
07:53roupa suja você mandava lavar em Portugal?
07:55Essa é muito chique, né?
07:57Tem muita grana.
07:59Então, o Belém foi um berço da cultura
08:01da Belle Epoque.
08:04Então, como era o berço da cultura,
08:06muita coisa vinha da Europa,
08:08de outros lugares também,
08:10para cá,
08:11e as famílias formavam seus acervos.
08:14Daí o gosto.
08:15Eu comprei azulejos.
08:17Eu sou colecionador de azulejos.
08:19Eu tenho bastante azulejos.
08:21Eu tenho uma coleção
08:22de 500 e poucos azulejos,
08:23diferentes.
08:25Não é unidade, não.
08:26Diferentes.
08:27Eu falo 500,
08:28assim,
08:28estampas diferentes de azulejos.
08:31Assim como eu tenho aqui na loja,
08:32depois eu vou mostrar para vocês,
08:34aquela mão francesa,
08:35aquela peça branca ali.
08:38Aquilo ali foi de uma demolição
08:39daqui de Belém.
08:40Então, eu tenho várias coisas
08:41de demolição daqui de Belém
08:45porque eu tinha amizade
08:47com demolidores.
08:49Então, quando eles iam demolir,
08:51olha, vamos demolir.
08:52aí eu ia lá e disse,
08:53ah, eu quero isso, isso, isso.
08:54Eu comprava coisas deles.
08:56Então, essa coleção de azulejos
08:58que eu tenho,
08:59eu não queria deixar perder, né?
09:02Porque eu custei muito
09:03a juntar isso tudo.
09:06Eu tinha coleção de revista
09:07Casa Cláudia,
09:08Casa e Jardim, tudo.
09:09aí saiu, assim,
09:11uma moda que teve, né?
09:13Dos vazinhos de cerâmica
09:16montados,
09:19um artesanato no Rio, né?
09:21Uma senhora que fazia isso lá.
09:23Eu vi isso.
09:23Ah, achei interessante.
09:25Eu estava em uma viagem, né?
09:27Peguei o telefone,
09:28telefonei, tudo.
09:29Falei com ela.
09:29Ah, pode vir aqui.
09:30Me dê o endereço.
09:31Eu fui lá.
09:32Quando eu cheguei lá,
09:36a senhora com quem eu tinha falado
09:38não estava.
09:39Estava a sobrinha dela.
09:40Aí eu me identifiquei.
09:41Ah, minha tia falou
09:42que você vinha aqui e tudo.
09:44Cadê os vazinhos?
09:45Eu olhei os vazinhos,
09:45ela tinha 10, 12 peças prontas.
09:48Eu comprei.
09:48Você despacha?
09:49Ela disse, ah, despacho sim.
09:51Me dê o endereço.
09:51Aí eu dei o endereço, tá?
09:53Meu nome, o endereço.
09:54Essa parede vai abrir.
09:55Ela disse,
09:55a senhora vai tirar isso?
09:57Ela disse, não faça isso.
09:58Isso é uma coisa muito antiga.
09:59Ela disse, tu queres?
10:00Eu te dou.
10:01E me deu os painéis todos de dentro.
10:04Tinha uns 5 ou 6 painéis dentro.
10:07Me deu.
10:09E a área de serviço
10:11era toda de azulejo português.
10:15Fora outros azulejos
10:16que tinha por lá também.
10:18Aí eu disse, tá bom.
10:19Ela disse, só que tem que se desocupar
10:21isso em 10 ou 15 dias
10:22porque os engenheiros vêm pra cá
10:24que a gente vai fazer a reforma e tudo.
10:27Aí eu consegui um pedreiro.
10:30pra tirar as peças, né?
10:32Consegui tirar algumas.
10:35E daí começou a...
10:36Eu já tinha um azulejo
10:38que na reforma aqui
10:40eu tinha encontrado lá no Quintal
10:42um azulejo muito antigo.
10:43Foi o meu primeiro azulejo.
10:44Ele tá até aquele, Selma.
10:46Pegue lá.
10:47Aquele azulejo, Selma.
10:50Aquele azul.
10:51Esse eu achei aqui na reforma.
10:58Ó.
11:00Mostra aqui pra câmera, por favor.
11:03Isso.
11:05Esse foi o meu primeiro azulejo.
11:07Tá?
11:10E ele, inclusive,
11:11tá restaurado.
11:12Isso aqui é restaurado.
11:17Faltava esse pedaço todinho.
11:20Tá?
11:21Na época que eu fazia a restauração
11:22eu restaurei a peça.
11:25E a partir desse azulejo
11:26eu comecei a juntar.
11:29Pegar interesse pelos azulejos.
11:31Engraçado.
11:32O gosto do paraense
11:33parece muito com o gosto do carioca.
11:36Né?
11:37O português não gosta do estilo
11:39ar-nouveau.
11:40Então, o nosso gosto
11:41pra arte
11:42vai muito parecido
11:44com o gosto da Europa
11:45mas da França.
11:47Entendeu?
11:48De Portugal é diferente.
11:49Completamente diferente.
11:50São Paulo
11:51já tem mais o gosto
11:53semelhante com o português.
11:55Já o carioca
11:56é mais com o francês
11:58que combina com
11:59o gosto do paraense.
12:01A gente percebe
12:02que as pessoas
12:02têm vontade
12:03de comprar as coisas
12:05mas a necessidade
12:07é pra outro tipo de coisa
12:09mais pra subir a existência.
12:11Vede, mas não é sempre.
12:13Por exemplo, esse ano
12:14até agora
12:15não rolou nada.
12:17Ano passado também
12:18tava de vagar?
12:20Também de vagar.
12:21Tava muito de vagar.

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