O economista e doutor em relações internacionais Igor Lucena concedeu entrevista exclusiva ao Fast News. O especialista analisou a queda de 0,3% no PIB dos Estados Unidos no primeiro trimestre de 2025. Donald Trump culpou o governo de Joe Biden pela baixa na economia e negou que o índice tenha relação com o tarifaço.
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NotíciasTranscrição
00:00E a gente segue falando sobre a economia norte-americana por, nesta semana, ter divulgado que o PIB dos Estados Unidos
00:07caiu 0,3% no primeiro trimestre deste ano.
00:13O presidente Donald Trump culpou o governo anterior e nega que essa queda tenha relação com o tarifácio.
00:20Então vamos entender um pouco isso? A gente conversa agora com o Igor Lucena, economista e doutor em relações internacionais.
00:27Igor, muito boa tarde pela sua participação aqui no Fast News.
00:32Muito boa tarde, é um prazer estar aqui com vocês.
00:35Igor, já começo aí perguntando para você, pode ser que aconteça agora, ele deu um passinho para trás, digamos assim, com medo de uma recessão, ele já culpou aí Joe Biden.
00:46Mas se a gente lembrar bem, quando o Joe Biden deixou o governo, não estava tão ruim assim a situação, na verdade.
00:52Exatamente, muito pelo contrário.
00:56O Joe Biden foi eleito apesar do bom desempenho econômico nos Estados Unidos.
01:01Quando a gente fala de PIB, o PIB dos Estados Unidos, durante o governo de Biden, estava crescendo acima dos 3%.
01:06E o que, de fato, impulsionou negativamente a sua queda durante a eleição foi a inflação.
01:13E é exatamente isso que o presidente Donald Trump está trazendo para si próprio.
01:19Quando ele fala em diminuir as taxas de juros, não tem sentido do ponto de vista econômico, porque o nível de desemprego ainda está baixo.
01:28Você está vendo, vocês mesmos disseram, uma alta criação de empregos.
01:32Isso significa uma economia aquecida.
01:34E uma economia ainda aquecida, segundo esses dados, e a gente ainda está tendo uma inflação alta,
01:40significa que o Banco Central não tem margem para cortar ainda as taxas de juros.
01:47O que nós vimos no primeiro trimestre, que ainda não é, a gente não pode considerar uma recessão,
01:52mas é algo negativo, já que é um indicativo de uma recessão,
01:57tem como sintoma básico o aumento muito grande das importações pelos setores,
02:04pelos vários setores americanos, sejam de varejos, manufaturados, intermediários,
02:10temendo as tarifas que iriam acontecer agora em abril e no final de março.
02:15Então, o que aconteceu?
02:16As empresas anteciparam, fizeram um grande conjunto de importações,
02:20e a gente viu aqui um desbalanço muito grande dentro da organização econômica americana.
02:28O grande ponto é que isso é pré-tarifas.
02:32As tarifas vão ser sentidas agora, nos próximos meses,
02:36e existe, sim, uma desaceleração econômica agora, sentindo na economia real.
02:42O que a gente vai começar a ver, se não tivermos um acordo,
02:45seria, sim, falta de produtos e o início de uma queda vertiginosa nos empregos,
02:52o que, com o segundo trimestre de queda no PIB, seria considerado uma recessão.
02:58E aí não haverá como o presidente Donald Trump culpar o presidente Joe Biden.
03:02Ele faz uma aposta que os países vão negociar termos comerciais melhores com os Estados Unidos
03:09antes do impacto na economia real.
03:12Agora, o impacto na economia real já está sendo sentido.
03:16Vários produtos não estão sendo importados, o setor de carros também está sendo impactado,
03:23e apesar da China ter aberto, pelo menos segundo informações nos últimos dias,
03:29um canal de conversações, ainda está muito longe da gente ter um acordo.
03:33Então, se o presidente Trump continuar avançando com essas tarifas,
03:37e nessa sua manutenção, provavelmente nós vamos ter um segundo trimestre na economia americana negativo.
03:45E aí, sim, a situação fica difícil.
03:47O próprio presidente Donald Trump já sente um pouco da queda na sua aprovação.
03:53E não há, pela população, segundo as últimas pesquisas de opinião,
03:57uma visão clara de qual é o objetivo.
03:59Ter melhores meios de troca com a China e com outros países
04:03não significa uma melhora na qualidade de vida da população.
04:08E o que mais é complicado de entender
04:10é que trazer manufatura básica para os Estados Unidos
04:14não vai melhorar a renda geral dos americanos.
04:17Hoje, onde, na economia desenvolvida,
04:21o valor agregado está no desenvolvimento da tecnologia
04:24e também na sua comercialização e onde os Estados Unidos já têm uma primazia.
04:29Então, é muito difícil, do ponto de vista claro e direto,
04:34que essas políticas de Donald Trump, de fato, vão resolver problemas de desemprego
04:39ou melhorar a qualidade dos salários dos americanos.
04:43Eu acho que muito pelo contrário.
04:45Falar que os americanos precisam aguentar essa situação
04:48é dizer para a pessoa que está necessitando comprar o pão de cada dia
04:54espere um pouquinho que depois o pão vai chegar daqui 3, 4 meses.
04:58Isso não funciona.
04:59Igor, puxando exatamente isso que você disse,
05:02ele ainda pede paciência para o povo
05:04e os americanos não estão acostumados com o valor tão alto de compra
05:08nas prateleiras, de produtos.
05:10Isso vai impactar diretamente também a popularidade de Trump?
05:15Isso impacta diretamente a popularidade de Trump
05:17e se as tarifas ficarem como estão,
05:20segundo dados das últimas universidades, principalmente da Pensilvânia,
05:24o americano médio vai gastar mais de 4 mil dólares por ano
05:28em produtos básicos de consumo.
05:31Trump já está com a popularidade abaixo dos 43%.
05:34Para o mesmo período comparado com o Joe Biden,
05:38até mesmo com ele, no seu próprio mandato,
05:40e Barack Obama é muito baixa.
05:43E não há uma visão clara de que isso vai melhorar.
05:45Ou ele, de fato, faz algum tipo de concessão
05:49e começa a negociar rapidamente com países como China,
05:53que tem um peso muito grande, ou a própria União Europeia,
05:56ou o que nós vamos sentir é um aumento rápido do desemprego,
06:01falta de produtos ou produtos muito mais caros.
06:03E aí você tem um efeito em cadeia que é muito rápido na economia americana,
06:07diferentemente da brasileira.
06:08Aqui, contratar e demitir é custoso.
06:11Nos Estados Unidos, não.
06:13Então, se não tem produtos vendendo,
06:15ou se os produtos estão vendendo pouco,
06:17os vendedores são demitidos,
06:19os shoppings demitem seguranças, limpezas,
06:21as lojas fecham e abrem de uma maneira muito rápida.
06:24Isso tudo vai ser impactado na visão americana
06:27de que isso não está sendo great again para o presidente Donald Trump.
06:31Então, os chineses não vão sentar na negociação
06:35se não tiver um mínimo de respeito.
06:37e Xi Jinping já disse que não vai negociar nos holofotes,
06:41vai negociar na mesa.
06:43E esse efeito, como um todo, prejudica até o Brasil.
06:46Se você tiver uma queda muito grande da economia americana
06:48nos próximos três meses,
06:50isso impacta a economia chinesa que vende para os Estados Unidos,
06:53impacta a economia brasileira que vende para a economia chinesa
06:56produtos, principalmente do setor de mineração,
07:01que é manufaturado na China e enviado para os Estados Unidos.
07:03Então, isso causa uma queda do PIB de uma maneira mundial.
07:07Do ponto de vista ortodoxo, e claro, na economia americana,
07:11não há uma visão clara de onde o presidente Trump quer chegar.
07:15Esse plano de, basicamente, mercantilista,
07:18de melhorar os termos de troca,
07:20não vai fazer a economia americana ser mais produtiva
07:23e as empresas americanas não vão conseguir, de imediato,
07:28voltarem para os Estados Unidos e produzir tudo o que querem.
07:30O próprio setor varejista americano já disse que precisa de uma isenção,
07:35caso contrário, seus produtos não vão chegar nas prateleiras pelos mesmos preços
07:39ou nem vão chegar.
07:40Então, acho que, de fato, o presidente Trump, nos últimos dias,
07:44começa a sentir o peso não só da sua popularidade caindo,
07:48mas também de uma grande parte dos empreendedores americanos
07:51e grandes empresas que estão vendo que isso não está levando a um objetivo fim.
07:56E, como a gente viu nos últimos dias,
07:59a gente teve uma alta das bolsas americanas,
08:02bem diferente do que vimos no começo do governo,
08:05desde o começo do mês de março,
08:07mostrando que, talvez, o presidente Trump já esteja com essa visão
08:11de que manter as tarifas do jeito que estão não vai ser possível.
08:16E, obviamente, o mercado financeiro,
08:18ele pressupõe um pouco dessas informações indiretas
08:23de que algum tipo de suavização pode estar muito mais próxima do que a gente imagina.
08:29Igor, você citou, eu quero retomar o que você falou mesmo,
08:33a respeito à recessão.
08:34Ela está pairando ali no radar dos Estados Unidos
08:37e isso pode impactar outros países, inclusive o Brasil, como você disse.
08:41Onde o Brasil pode sentir isso de fato?
08:44E também só vou ligar aqui mais um ponto.
08:46O Trump, ele disse também,
08:48em período que os Estados Unidos estão em período de transição
08:51e tenta minimizar esses impactos,
08:54ou seja, que não vai acontecer uma recessão.
08:58Gostaria que você falasse sobre isso.
09:01É muito difícil a gente dizer qual é essa transição.
09:04Se o presidente Trump fala de uma transição como espécie de volta
09:07a um período onde os Estados Unidos teriam grandes fábricas industriais
09:11e que empregos naquele setor do meio oeste americano, no Rusty Belt,
09:16voltariam, sejam da produção de navios ou setor intensivo em aço e ferro,
09:23é muito difícil que isso seja uma realidade,
09:26porque os custos de produção nos Estados Unidos seriam totalmente inviáveis.
09:30Eles fariam produtos muito mais caros.
09:33Então, essa transição que o presidente Trump fala,
09:36ele não consegue dizer exatamente o que é.
09:40Agora, se você tentar entrar um pouco na cabeça dele,
09:43a transição seria
09:44os Estados Unidos vão ter grandes acordos comerciais,
09:48muito mais vantajosos e vão vender muito mais para o resto do mundo?
09:51Talvez esse seria o seu objetivo.
09:53Mas não está muito claro que isso vai se tornar uma realidade.
09:57Agora, quando a gente pensa de efeitos para o Brasil,
10:00o que pode acontecer?
10:01Primeiro, os produtos mais caros nos Estados Unidos
10:04vão fazer com que haja uma espécie de exportação de custos,
10:07ou seja, o que o Brasil importa dos Estados Unidos vai ser mais caro,
10:11sejam máquinas, equipamentos, softwares, medicamentos,
10:16e isso vai fazer com que os preços no Brasil se tornem mais caros.
10:19Então, a gente meio que importa um pouco de inflação dos Estados Unidos
10:22e que o Banco Central Brasileiro, as autoridades brasileiras,
10:25não vão ter basicamente nada o que fazer.
10:27Isso gera uma inflação de custos internos aqui no país.
10:30E, por outro lado, se você tem um desaquecimento da economia
10:34de uma maneira geral, você vai ter que o Brasil vai exportar menos,
10:39já que uma das nossas pautas de exportação é minério de ferro e também petróleo.
10:45O petróleo está caindo no mundo,
10:47e por causa dessa desaceleração econômica isso é muito ruim,
10:50porque o Brasil tem uma das suas grandes fontes de receita,
10:54inclusive no Orçamento Geral da União, de royalties de petróleo.
10:57Se o barril do petróleo cai por uma desaceleração econômica,
11:01você tem basicamente uma queda nas receitas do governo,
11:05uma queda nas receitas da Petrobras,
11:07e isso impacta até mesmo a capacidade do setor público de investimento,
11:10pagamento, e sim, pode ter um impacto no final do ano
11:14na razão dívida PIB,
11:15já que o Brasil vai ter um aumento do nosso buraco fiscal.
11:20Então, as tarifas de Donald Trump, elas são danosas,
11:23não só do ponto comercial,
11:25mas também para o Brasil do ponto de inflação
11:27e até mesmo dentro do nosso orçamento público,
11:30já que o mundo inteiro enxerga que essas tarifas em manutenção
11:34significam queda de consumo de petróleo,
11:37queda de comércio,
11:38e isso impacta países produtores como o Brasil.
11:40Igor Lucena, economista e doutor em relações internacionais.
11:47Igor, muito obrigada pela sua participação aqui no Fast News,
11:50um ótimo dia para você.
11:52Eu que agradeço, muito obrigado e uma boa tarde a todos.